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são curiosas. Mesmo aqui, não saem do rebanho.

      Brazuca entra na sala, afastando-se um pouco de Grace, que parece estar prestes a entrar em combustão espontânea.

      — Fala-me do que lhe deste. Sabias?

      — Que morreria? Claro que não. Não é uma coisa que costume fazer com frequência, na verdade. A Clem não confiava em mais ninguém e eu devia-lhe um favor. Sabia que tinha contactos. Mas disse-lhe que esta seria a última vez durante um tempo. O seu vício estava a descontrolar-se e não conseguiria mantê-lo escondido se continuasse assim. Então, o Bernie acabaria por se envolver e eu acabaria na merda. Como estou agora, suponho.

      — De onde tiras a mercadoria?

      — Espera — pede Grace, virando-se para Brazuca. — Foi por isso que te enviou? É por causa da droga? Por amor de Deus! A minha irmã morreu!

      Priya olha para a porta.

      — Parece-me que vocês têm algumas coisas para esclarecer.

      Brazuca aproxima-se mais dela, certificando-se de que exagera o seu coxear. É um truque barato, mas não se importa de recorrer a ele quando é útil.

      — Talvez devêssemos falar em privado. — O que, percebe agora, é o que devia ter acontecido desde o começo.

      — Quero ouvi-lo — diz Grace, cruzando os braços.

      — Não — responde Priya. — Não queres. — Então, sai com duas malas de marca. Uma delas será a dela.

      Brazuca lança um olhar arrependido a Grace enquanto segue a traficante da sua irmã para a porta, deixando-a mais ou menos tal como a encontrou. No meio de uma divisão, perdida e triste.

      Alcança Priya no elevador, sem se incomodar em disfarçar que consegue mexer-se depressa quando realmente quer. E só durante breves espaços de tempo.

      — Não posso dar-te um nome — diz ela, quando a alcança. — Entendes, não é? O Bernie não entenderia, mas tu és uma pessoa mais razoável. Percebo só de olhar para ti.

      — Acho que gostava realmente dela. Desta vez, não é apenas a atitude de macho. Não posso voltar sem nada.

      Ela assente, compreensiva. Ambos têm de prestar contas a alguém. Abrem-se as portas do elevador e ela entra.

      — Bebes?

      — Já não. — Não desde que Nora o prendera a uma cama e lhe deitara rum com analgésicos pela garganta. O que significa que, oficialmente, conta como uma recaída, embora não possa considerar-se culpa dele. Subestimara-a e pagara o preço. Recorda que, então, também se sentira um pouco como uma puta. Parecia ser um denominador comum nos seus acordos com mulheres.

      — Uma pena. Há um bar em Gastown que acho que é muito bom. Servem uns coquetéis de fruta com chapeuzinhos. O Lala Lair.

      Fecham-se as portas.

      Brazuca pensa em voltar ao apartamento para ajudar a irmã de Clementine a organizar todos os seus pertences muito caros e acompanhá-la na sua dor. Pensa melhor e carrega no botão do elevador. Ao fim e ao cabo, tem um trabalho para fazer e, por muito que deseje atribuir a conversa com Priya sobre beber um copo ao seu sex appeal, suspeita que ela tinha uma motivação diferente. Disse-lhe o que precisa de saber, da única forma que considerava segura.

      Quanto a Grace… Bom, só espera que tenha conseguido o que precisava dele.

      8

      Espero por Simone atrás do palco de um pequeno bar de cervejas artesanais que, às terças-feiras à noite, se transforma num clube drag. Há lantejoulas e borlas por todo o lado. Sinto-me como se estivesse no pesadelo da rapariga de um harém, à espera que o xeque venha fazer o que quiser comigo. Há uma drag queen no pequeno camarim em que me encontro, a aplicar um contorno denso de olhos líquido com a precisão de um cirurgião. Ignora-me por completo enquanto calça as botas de salto alto e sai pela porta. Segundos mais tarde, entra Simone, coberta de purpurina corporal e com uma roupa verde-lima que é mais uma t-shirt do que um vestido. Faz-me pensar na primeira vez que nos vimos num grupo de apoio a alcoólicos. Usava algo semelhante, possivelmente cor-de-rosa choque.

      — Não tens vindo às reuniões — comenta, quando me vê sentada junto da prateleira de acessórios e lenços brilhantes.

      — Eu sei — respondo. Teria um desgosto se soubesse que estava a ir a outro tipo de reuniões. Mas, em minha defesa, mal posso encarregar-me dos meus próprios problemas. Como posso esperar que ela o faça?

      Tira os saltos e senta-se à frente do tocador para esfregar os pés.

      — Também não atendeste as minhas chamadas.

      — Não gosto de falar ao telefone — digo. Desde o ano passado, quando fui arrastada até à margem de Vancouver Island, depois de a minha filha, Bonnie, ser raptada, estive a evitar Simone e os seus olhares perspicazes. Gosta muito de falar de sentimentos. Sobretudo dos dela, mas, de vez em quando, também se interessa pelos meus.

      — E, agora, queres que investigue o passado do teu pai, não é? — Tira o vestido. O corpo musculado que há por baixo é uma publicidade do valor estético da depilação corporal. — Recebi a tua mensagem ontem, Nora, mas foste tão má amiga comigo que não sei se me apetece ajudar-te desta vez. Dizes que encontraste uma organização de veteranos para os marines do Líbano? Talvez devesses investigar por aí — replica, sabendo bem o que penso de falar com desconhecidos pela Internet sobre algo que não seja sexo.

      É difícil sabê-lo só de olhar para ela, mas Simone é uma espécie de perita em segurança informática. Tem a sua própria empresa, que gere como o seu alter ego Simon, e parece satisfeita com uma vida dupla com sapatos de salto de agulha dourados. Não me ofereço para lhe pagar pela sua ajuda porque suspeito que seria prejudicial para mim. Portanto, espero enquanto tira a peruca e a maquilhagem e veste um fato de treino por cima das meias. A única coisa que resta da sua personalidade drag é as unhas compridas e pintadas, que usa para coçar o couro cabeludo depois de ter tirado os ganchos da peruca.

      — Desculpa — desculpo-me, com um sorriso. — Vamos falar de ti.

      Sorri e tira-me da sala.

      — Esperava que me perguntasses. Estou a sair com um rapaz novo, o Terry, mas ainda tem um pé dentro do armário. Foi um pesadelo maravilhoso.

      Tremo com a imagem que me vem à cabeça e questiono-me, não pela primeira vez, porque é que quando se pergunta a alguém pela sua vida em geral, o consideram um convite para nos encher os ouvidos com a sua vida sentimental. Mas trata-se de Simone, portanto, mostro-me mais indulgente.

      — Qualquer um teria sorte por te ter.

      — Até tu? — pergunta-me, num tom de brincadeira. Seguro-lhe a porta aberta e pisca-me um olho enquanto sai.

      — Sobretudo, eu. — E é a verdade. Quem não quereria uma perita em segurança informática como amante? Pensando melhor, entendo o dilema de Terry. Não há nada que não conseguisse descobrir se quisesse.

      — E o que farias quando tirasse as meias e te mostrasse a pila? Conseguirias lidar com um homem como eu?

      A pergunta perturba-me. Desde que se apresentou como mulher e, além disso, uma mulher capaz de cantar perfeitamente a Single Ladies, nunca pensei nela como homem. Não sei se quer que o faça. Mesmo de fato de treino, sem a peruca, com o cabelo curto e sem maquilhagem, parece-me a pessoa mais feminina que alguma vez conheci. Ri-se.

      — Não faças essa cara de surpresa. De todas as formas, não és suficientemente lésbica para mim.

      De repente, sinto-me ofendida. Não sou suficientemente lésbica? Como se atreve? Revejo a minha energia feminina, que continua a ser tão duvidosa como sempre foi. Com posso não ser suficientemente lésbia? Ora…

      — Investigarei o teu pai, Nora. Sabes que o farei. Mas não posso começar senão

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