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os exames em quinze dias. Do hospital, nós fomos direto ao Aeroporto Côte d'Azur, onde um jatinho particular nos aguardava. Foram quase dez horas de voo direto. Fiquei exausto.

      — Ei, maninho. Acorde. Nós chegamos — disse meu irmão, enquanto eu abria os olhos.

      Ao descer do avião, dois carros pretos nos aguardavam próximos à pista de pouso do aeroporto de Nova Iorque. Meu irmão pedia aos motoristas que retirassem nossa bagagem do avião, quando Núbia me ajudou a sentar no banco de trás de um dos carros, deixando-me sozinho logo em seguida. A outra porta do carro onde estava se abriu e um homem sentou-se ao meu lado. Era Aidan. Seus olhos estavam marejados e os lábios tremiam, num esforço de não deixar escapar um soluço. Olhei-o, cobri meu rosto com as mãos e chorei. Ele se aproximou, beijou-me a têmpora e levou minha cabeça ao seu peito.

      — Não se preocupe. Vai ficar tudo bem. Nós vamos para casa — sussurrou ele ao meu ouvido, confortando-me.

      O relógio marcava 22h13, quando entrei no meu quarto. Aidan carregava uma de minhas malas e a acomodou ao lado da cama, agradecendo ao motorista por tê-lo ajudado com as outras. Núbia e Marcus estavam na porta, olhando-me, quando sentei na cama e deslizei minhas mãos sobre os joelhos. Ela sorriu com a boca fechada e puxou o braço do meu irmão, encostando a porta. Fiquei sozinho com Aidan. E era impossível evitar as lágrimas que molhavam minhas coxas. Ele agachou-se e levantou minha cabeça até encontrar meus olhos.

      — Você não sabe como eu sinto por tudo que aconteceu — expressou, com a boca trêmula.

      — Aidan, muito obrigado por ter me acompanhado. Agora eu quero dormir um pouco. Estou muito cansado da viagem.

      — Vou dormir aqui hoje com você.

      — Não. Você vai dormir na sua casa. Preciso de um tempo para pensar em tudo que aconteceu. Preciso ficar sozinho. Entende isso?

      — Mas não vou incomodar você. Só quero ficar aqui...

      — Não, Aidan! Preciso ficar sozinho. Isso não tem nada a ver com você, e sim comigo. Por favor, vá para casa.

      Ele me beijou os cabelos e saiu do quarto, fechando a porta, enquanto me olhava, demonstrando a vontade que carregava em ficar comigo naquele momento. Deitei e dormi. Meus olhos se abriram, quando um toque avisava que tinha uma nova mensagem no celular:

      “Sei que as coisas estão difíceis agora, mas acredito que tudo vai passar. Não esqueça de mim. Espero por você. Amo você! Feliz ano-novo! Aidan”.

      Os dias que se seguiram àquele eram longos, silenciosos e vazios. Em meu peito, carregava a sensação do nada. E a vida parecia não ter graça nenhuma. O frio que desaparecia de Manhattan dia após dia levava as lágrimas do meu rosto consigo, mas não as dores que sentia em minha alma. Era difícil aceitar o que papai tinha feito comigo. Como não lembrar de seu olhar de ira, da cusparada na cara, do que disse de mim, daquela bengala? Ao tentar dormir, ainda tinha lampejos de um homem de branco com uma bengala na mão, caminhando em minha direção. Quantas vezes acordei sobressaltado durante a noite? Quase sempre, mais de uma vez. Era um tormento. Quase três meses passaram-se e pouca coisa havia mudado dentro de mim. Mas tomei consciência de que precisava fazer alguma coisa para sair da situação em que estava. E aproveitei que a primavera deu as caras em Nova Iorque para passear pela cidade.

      Era uma manhã de sábado, quando Richard e eu marcamos de nos encontrar no Central Park no fim da tarde. Havia tempos que não o via e pensei que fosse bom retomar minhas amizades. O que não sabia é que ele não me encontraria sozinho.

      — Oi! Gaius! Aqui! — acenava ele, quando me viu tomando um cappuccino.

      Nesse momento, vi-o. Era Pablo. Caminhava com Richard em minha direção. Meus olhos arregalaram! Será que ele contou ao Richard que nós transamos?

      — Oi, amigo! — disse eu, abraçando Richard, meio temeroso.

      — Você lembra de Pablo, não? Ele esteve na sua festa de aniversário ano passado.

      Graças a Deus que ele não sabe de nada. Pensei.

      — Lembro sim. Como vai, Pablo? — perguntei, com a voz tímida, quase não olhando em seus olhos.

      Pablo sorriu com a boca fechada e disse que eu estava muito bonito. Enrubesci e sorri.

      — Obrigado!

      Nós andávamos pelo Central Park, enquanto falávamos amenidades. Richard me contava que terminaria o curso de moda no fim daquele ano e que pretendia passar alguns meses na Itália, logo em seguida. Pablo escutava nossa conversa e tentava nos deixar à vontade. Parecia entender que Richard e eu tínhamos assuntos atrasados, então transformou-se em uma companhia silenciosa naquele primeiro momento. Algumas vezes, surpreendi-o olhando para mim. Aqueles mesmos olhos pretos e sedentos que encontraram os meus no meu quarto em Monte Carlo. Vire-se! Vou comer você em pé! Lembrei, desconcentrando-me do que Richard dizia. Em outro momento, Pablo sugeriu que fôssemos comer alguma coisa, e enfatizou estar faminto.

      — Por mim, tudo bem — confirmou Richard.

      Nós entrávamos no táxi, quando Pablo disse ao motorista para ir ao Chinatown. Hum! Ele gosta de comida chinesa. Pensei.

      — Boa noite! Meu amigo e eu queremos zong zi para dois — disse Richard ao garçom, já no restaurante.

      E continuou:

      — O que quer comer, meu amor? — perguntando a Pablo.

      Ah, Meu Deus! Não acredito! Richard está namorando Pablo? Pensei.

      — Quero mapo tofu e dan dan mian, por favor. Obrigado! — respondeu Pablo, olhando para o garçom.

      O restaurante tinha pouca iluminação e estava abarrotado de pessoas. Por sorte, conseguimos uma mesa aos fundos. Onde estávamos, podíamos ver toda a movimentação das pessoas e dos garçons. Richard e Pablo estavam à minha frente, do outro lado da mesa pequena que nos separava. Richard contava-me sobre como pretendia ingressar na Gucci de Florença, quando Pablo chamou o garçom e perguntou o que era huangjiu. O garçom explicou-nos que era um vinho amarelo chinês, preparado com uma massa feita com arroz, pianço ou trigo. Até eu estou com vontade de beber. Pensei.

      — Acho que vamos experimentar. Obrigado! — disse Pablo.

      Nossos pratos chegaram. Richard e eu conversávamos, empolgadamente, quando algo me desconcentrou. Era Pablo, e estava comendo. Nesse momento, percebi-me olhando-o, curioso. Ele começou com o mapo tofu e depois mesclou com o dan dan miam. Para o primeiro, usou um garfo, e para o último, um hashi. Depois, os dois, simultaneamente. Tinha o corpo inclinado para frente, os cotovelos sobre a mesa, a cabeça baixa e as mãos ágeis. Comia depressa, sem muito mastigar. Quase não usava o guardanapo para absorver o excesso do molho da carne suína, que melava seus lábios. Entre um prato e outro, um ou dois goles do vinho amarelo e mais comida. Mastigava com força, com prazer. Ele era rude à mesa. E aquilo o transformou em um homem selvagemente sexy para mim. Oh, meu Deus! Sinto um latejar entre minhas pernas. Estou com tesão! Pensei. Richard continuava falando, quando pedi licença e fui ao banheiro. Olhei-me no espelho, sem saber ao certo o que pensar, e lavei as mãos, demoradamente. Acho que esperava que a sensação da água tocando meus dedos acalmasse meu corpo. Mais controlado, retornei à mesa. Vi-os conversando. E meus olhos percorreram aquele corpo queimado. Ele vestia uma bermuda marfim e uma camiseta branca, que valorizava seus braços. Calçava um tênis marrom e ainda tinha a barba por fazer. Será que ele gosta de ter essa barba malfeita? Que mau gosto! Pensei, sentando-me novamente à mesa. Pablo havia terminado de comer, e bebia seu huangjiu, quando nossos olhos se encontraram. Era visível, para mim, que eu o desejava. Fiquei receoso que Richard percebesse nossos olhares, então me contive e tentei me concentrar na conversa. Comentei que estava pensando em passar um tempo em Manhattan e, talvez, fizesse um curso de fotografia. Richard vibrava com essa possibilidade, afinal, eu era o único amigo mais próximo dele, e depois que tinha ido morar em Monte Carlo, no ano passado, ele acabou ficando

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