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rosto. Parecia incomodado naquele momento. Meio desconcertado, disse ele a papai:

      — Boa noite, Senhor Barrys!

      Lembro bem do rosto de papai naquele instante. Sua expressão era de quem estava desconfiado. Aquela testa franzida não era só curiosidade. Papai nos deixou e foi ao encontro de Marcus, que estava na mesa com Juan. Onde está Aidan? Não importa! Pensei. Disse a Pablo que devíamos voltar à mesa e dar um pouco de atenção a papai.

      — Certo. Mas só se me prometer que vamos nos ver mais tardecondicionou ele, tentando agarrar minha cintura por baixo d’água.

      — Pablo, meu pai está aqui! E nós dois ainda não conversamos sobre eu ser gay. Entende isso? — exclamei com intensidade.

      — Tudo bem, tudo bem. Mas vamos nos ver mais tarde?

      — Eu... acho que sim. — respondi, cambaleando a voz e com um meio sorriso nos lábios, fazendo charme para ele, enquanto jogava água em seu rosto.

      À mesa, papai conversava com os irmãos latinos, e contou que visitou o México há alguns anos, passando parte dos dias em Tijuana. Percebendo que todos estavam empolgados na conversa, aproximei-me do meu irmão e perguntei:

      — Onde está Aidan?

      — Ele viu você e Pablo se beijando, e saiu. Parecia irritado — respondeu, sussurrando.

      — Que droga! Eu não morro de amores por ele, mas também não quero machucá-lo. Que inferno!

      A voz do meu pai nos interrompeu.

      — O que vocês estão falando tão baixinho aí, hein?

      — Nada importante, papai. Gaius perguntou onde estava Aidan, e eu respondi que ele já tinha saído. Que droga, Marcus! Você não devia ter comentado que Aidan está aqui! Pensei.

      — Aidan está aqui? Onde está? — perguntou papai a Marcus.

      — Acho que ele foi até à suíte pegar alguma coisa, mas não sei se ainda vai voltar.

      — Marcus, quero ver Aidan. Mande chamá-lo.

      Agora eu estou fodido, meu Deus! Marcus me olhava na esperança de que eu mesmo dissesse o que ele deveria fazer. O que eu faço agora? Papai era muito amigo do pai de Aidan, o Senhor Daan. Praticamente enriqueceram juntos. Dizia sempre que Aidan era o filho loiro que ele não teve. Quando eles três se encontravam nos eventos da empresa ou até mesmo para jogar golfe, não se desgrudavam um minuto. Por vezes, o companheirismo de papai com Aidan no esporte arrancava comentários enciumados do Senhor Daan. Lembro-me que, certa vez, ele comentou que gostaria que Aidan morasse conosco, pois apreciava muito a sua companhia. O que papai não sabia era que, assim como eu, Aidan era gay. E aquele louco queria me pedir em namoro no dia do meu aniversário aos meus pais. Papai iria dar uma surra nele. Grosso do jeito que é! O que faço? Aidan está com raiva. Saiu daqui furioso. E se ele disser a papai que eu estava beijando Pablo? Oh, meu Deus! O que faço? Foi quando minha boca ultrapassou a velocidade do meu pensamento.

      — Vou chamá-lo, papai! Vou ao banheiro, e aproveito para chamá-lo! — gritei, tentando controlar a ansiedade da voz, depois que percebi que papai me olhava intrigado.

      Ainda tinha as mãos trêmulas, quando apertei o botão 6 do elevador. Olhava para o visor e pensava: vai rápido, vai rápido. E lá estava no mesmo corredor dos belos quadros, que apreciei no início da tarde. O espelho da luxúria me lembrou da última conversa com Aidan, e como o deixei falando sozinho. Droga! Preciso que ele não diga nada a papai sobre o beijo com Pablo. Pensei. A porta da suíte estava entreaberta e, vagarosamente, empurrei-a. Vi-o em pé na sacada da suíte, descalço, apenas de bermuda, com os cabelos molhados e penteados, tendo apenas a companhia de uma garrafa de uísque e um cinzeiro que servia de descanso para o fim de mais um cigarro. Olhava concentrado para o horizonte ou para o grande bosque nos arredores do hotel, ou até mesmo para o nada. Aos primeiros passos, fui recepcionado por nocturne, de Chopin. Minha mãe adorava essa peça. Pensei. Dois abajures acesos ofereciam uma iluminação intimista ao ambiente. Alguns passos meus foram o suficiente para que minha presença fosse percebida por ele. Nisso, virou-se em minha direção. Ele tinha a mandíbula fechada, os olhos vermelhos e o semblante triste. Encarou-me direto na pupila, e deixou que os segundos de silêncio falassem o que sua boca se recusava a dizer. Não foi preciso muito tempo daquele olhar constrangedor para saber o quanto eu o tinha machucado. Mas o ápice da minha consciência se deu quando uma tímida lágrima escorreu dos seus olhos. Ele virou-se para o horizonte novamente e tentou disfarçar, enxugando-a com as costas da mão. Envergonhado, com um nó na garganta, aproximei-me lentamente e pus-me a olhar para horizonte com ele.

      — Minha mãe adorava Chopin, sabia? — comentei.

      Tive silêncio como resposta. Apenas os uivos dos ventos e a maciez de Chopin podiam ser ouvidos. Era embaraçoso estar ali, principalmente depois do que vi instantes antes.

      — Papai perguntou por você — comentei novamente, tentando ver sua reação de soslaio.

      — Por que está aqui, Gaius? — perguntou, encarando meu rosto de frente.

      — É que você saiu... E papai quer que você vá vê-lo. Então, vim chamá-lo — respondi, gaguejando e sem conseguir olhá-lo direito.

      — Acho que prefiro não ver seu pai hoje — comentou, com a voz suave, porém firme.

      Virei-me de frente para ele e disse:

      — Aidan, sinto muito pelo que aconteceu na piscina. Quero que saiba...

      — Você sabe por que estou aqui, Gaius? — interrompeu-me, olhando-me nos olhos, com a voz meio exaltada.

      Depois, continuou:

      — Vim até aqui por você. Porque senti sua falta. Depois que foi embora de Nova Iorque, vi-me perdido, distante de quem eu amo. Nunca escondi que gostava de você. E não esconderei! O que aconteceu entre nós naqueles dias que passamos juntos foi muito forte para mim. Talvez, não tenha sido para você, mas para mim foi! Você nunca soube, mas é bom que saiba agora que foi o primeiro homem com quem fui para a cama. Não foi o único, mas foi o primeiro. Depois daqueles dias, eu quis ter uma relação, mas você sempre fugiu e me evitou, nunca atendeu ao celular ou quis me encontrar. Então, conversei com seu irmão e disse que estava apaixonado e, também, que iria conquistar você. Marcus sempre me apoiou, incentivou e aconselhou, mas você nunca me deu nenhuma chance de mostrar o quanto eu o amo e o quero fazer feliz. Nunca pensou em como eu me sentia, quando o convidava para uma vernissage ou mesmo para ir ao teatro e você inventava uma desculpa, dizendo que não podia? Nunca pensou em como eu me senti todas as vezes que chegava ao apartamento do seu irmão para ver você, e via quando se trancava no quarto até eu ir embora? Nunca passou pela sua cabeça que eu gostasse de você de verdade? Nunca considerou que o que eu sinto por você é amor? E então eu venho aqui para vê-lo, e o que encontro? Você beijando um cara que mal conhece? É isso que mereço por amar você? Que droga, Gaius! Que droga! O que é que preciso fazer para que entenda que eu amo você, droga? — e, num ato impulsivo e violento, tomou a garrafa de uísque na mão, atirou-a com força na parede, encarando-me ferozmente com aqueles olhos cor de âmbar.

      Era janeiro em Nova Iorque. O frio de dezembro e a decoração de Natal desapareciam diante de nossos olhos dia após dia. Os americanos deixavam para trás as emoções das festas e retomavam novamente suas rotinas de trabalho. Tudo voltava ao normal. Ainda morava com Marcus e Núbia em Manhattan, mas já estava preocupado com o estado de saúde da minha mãe, e pensava, seriamente, em mudar para Monte Carlo. Lembro-me que no início daquela primeira semana do ano, meu irmão comentou que iria viajar na sexta-feira para Connecticut para participar de um congresso sobre serviços financeiros imobiliários e que iria aproveitar para descansar. Disse-me que ficaria na cidade uns dois ou três dias a mais depois do fim de semana. Núbia e Arthur iriam com ele.

      — E vou ficar sozinho aqui? — perguntei, indignado.

      — Olhe, maninho!

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