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que alguem o definiu um doente com inveja das doenças dos outros… Desatou então a gargalhar com lagrimas nos olhos. Perdeu o pé. Arrancou as azas disformes ao Sonho e rojou-as com maldade no enxurro. – Encharcou-as de lama e empoou-as de estrellas… O vestido ficou mas era o d'um espectro… Não nos podemos medir todos pela mesma craveira. Fialho tem de tudo na alma: a casa de hospedes, a existencia reles d'estudante, a pobreza, as mil saburras, os pequenos nadas que gastam, desgastam e transformam, e uma alma vibratil, um feixe de nervos (capaz de tempestades que se domam com uma palavra) ligado a uma enchente de sonho e a um orgulho doentio, como os que sentem dentro de si, e o suportam, um mundo desconhecido e nunca dantes navegado. Fialho, se o virassem do avêsso, escorria ternura… É tambem um timido capaz de todas as audacias, e que sae da doença e do isolamento com desespero e escarneo. Esta figura tão conhecida de todos nós, não é a exacta expressão da sua alma. Ainda hoje ninguem se entende…

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      – O que eu sofri! – dizia elle. – Tiveram-me preso oito annos n'uma botica alli na Bemposta, ao pé da Escola do Exercito, na idade em que queria viver. Estragaram-me a vida, encheram-me de desespero. Quando me soltaram não imagina a minha alegria! Podia ter sido outro… Ter saude, ser forte!.. O que eu sofri! D'uma vez, no Reporter, o Martins mandou-me escrever um artigo sobre uma kermesse de fidalgas. Fui e fiz uma troça, e elle rasgou-me os linguados na cara. Para me vingar, tirando um bocado ás noites, escrevi um artigo formidavel para publicar em folheto. Era na occasião em que essas peidorreiras arranjavam um bazar para os pobres, que rendeu oitocentos mil reis. Ora eu descobri por acaso um gallego, que se juntava com outros e tiravam todas as semanas meio dia de ganho, para irem ao domingo ao hospital dar cigarros aos doentes, penteal-os, cortar-lhes as unhas, untar-lhes a cabeça com banha de porco. É um velho, de barba de passa piolho, que está sempre no largo de Camões. Homem de poucas falas. Tratou-me mal. Tive prompto o folheto em que comparava essas mulheres, cheias de snobismo, com adulterios e infamias, com esse santo desconhecido… Imagine… Perdi o artigo.

      E depois, falando da mulher Oliveira Martins: – Não era a mulher que convinha áquelle homem. E elle subordinava-se-lhe. Foi ella que o fez confessar á hora da morte. Contou-me o Sousa Martins que a sacudira de ao pé de si ao morrer…

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      Fala do livro A Cloaca, um d'estes livros que se sonham e nunca se chegam a escrever:

      O primeiro capitulo está feito: é uma festa da alta sociedade no claustro da Batalha… Aproveito a epoca do Burnay e do marquez da Foz, a lucta da finança, quando o Foz tinha palacios e o Moser carro a duas parelhas. Deram-se festas esplendidas… Tenho as figuras todas, homens de negocio e jornalistas, o Mariano e o Navarro… Um dia alugam um comboio especial e vão dar uma festa no claustro da Batalha. É uma ceia formidavel, com mulheres da grande roda, politicos, literatos, e, dentro do claustro, entre a grandeza e a severidade d'aquellas pedras, caem de bebados e mijam pelos cantos, nos tumulos. O principe tambem lá está, com o conde de Maricas – fedes: no fim do banquete, á sahida, a babar-se, escreve nas paredes monumentaes esta palavra obscena: p… Os outros riem-se, as mulheres aplaudem. Fora a multidão apupa. Outro capitulo ha de ser a noite em que os jornaes apregoaram em suplemento o escandalo Foz e a sua prisão: – Foi n'essas horas – dizia a marqueza – que os cabellos se me puzeram brancos da noite para o dia.

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      Nunca terminou outro livro A Quebra, que chegou a trezentas paginas impressas, no editor Costa Santos. Tinha capitulos admiraveis. Acabou por o inutilisar: – A minha dificuldade é a falta de proporções. Perco-me n'um incidente, e quando mal me percato estou em quatrocentas paginas. – Sei tambem que escreveu alguns capitulos d'Os Cavadores. Talvez d'Os Ceifeiros pertencessem a esse livro, em que elle queria pegar no homem do campo e leval-o, sempre explorado, desde o baptismo até á morte…

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      Inventou este nome para o conde de Arnoso, a rainha Draga, e diz do retrato a oleo que o Columbano lhe pintou:

      – O Columbano é tão cortezão que lhe poz um velho olho do Eça de Queiroz.

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      Contemplando o cadaver do Cardia:

      – Só aos quarenta anos é que se sabe o que é isto!

      Isto é a morte, á qual tem horror, assim como á velhice.

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      E falando a proposito do Cardia:

      – Eu tambem sou assim… Ha dias em que ninguem me arranca seja o que fôr da cabeça. Sinto a mesma impressão de vasio que o Cardia sentia. Depois escrevo por impetos uma pagina, pedaços destacados que me matam de desespero para ligar. E se não escrever logo, passadas horas já não posso, não sei… Varreu-se-me tudo!

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      Está furioso com a inauguração do monumento ao Eça. No fundo nunca o pode vêr: faltou-lhe o carinho, a consideração – e isso maguou-o muito – que rodeou o grande escriptor dos Maias. Elle proprio diz: ganhou sempre a trabalhar menos que um pedreiro. No jornaleco A Tribuna escreveu em dois numeros successivos, sem assignatura, as seguintes notas com o titulo o monumento

      Já noticiamos n'outro numero do nosso jornal com todos os seus detalhes e pormenores, como foi a festa d'inauguração do monumento a Eça de Queiroz. Damos hoje um reflexo do humor da multidão que assistiu ao acto. Porque, emfim, a nosso vêr, tudo é documento para a historia.

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      – Sobre a nudez forte da Verdade, o manto diaphano da phantasia. Dizem os amigos que n'esta frase se alegorisa a obra de Eça. Mas olha cá. Estando a Verdade completamente nua do ventre para cima, e só rebuçada d'ahi para baixo, o que sob o manto da fantasia se guarda é indecente.

      – Ahi está a razão porque a alegoria é flagrantissima.

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      – Tu, se fosses casado, davas o Primo Bazilio a lêr a tua mulher?

      – Lá isso não. Mas não tinha a mais pequena duvida em o dar á tua.

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      – Que lhe parece a Verdade do monumento?

      – Um calix de bitter para fazer bocca ao Chat Noir, que fica em baixo.

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      – Condessa, de todos os cavalheiros que fallaram, qual d'elles é o conde d'Avila?

      – O conde d'Avila são todos.

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      – Este Monteiro Milhões, que inconveniencia! Consentir que das suas cavallariças um burro esteja a interromper os oradores!

      – Condessa, é o echo.

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      – O que eu n'esta consagração sobretudo admiro, é o grande coração do conde d'Arnoso. O Municipio devia premiar tão nobre musculo.

      – Com uma urna, como se fez ao D. Pedro IV?

      – Com uma urna não. Com uma travessa.

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      – Seria interessante conhecer todos os tramites do trabalho de creação do esculptor, até ao momento da estatua apparecer.

      – Ah, eu lh'os conto. Primeiramente, o Carlos Mayer, na sua qualidade de judeu, queria uma descida da Cruz, e por isso, o grupo do Eça e da Verdade cheiram um pouco á scena da Paixão. Veio depois o Arnoso a lembrar se dessem ao monumento reminiscencias mais contemporaneas, ex.: o Genio perguntando á Verdade quantos dentes queixaes queria tirar. D'esta dualidade d'inspiração resulta o mysterio, que faz com que o monumento seja o que v. ex.a quizer, sendo o melhor – não perguntar.

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      Apparece no estrado o Conselheiro António Candido.

      – Silencio! Vae fallar o maior orador da Peninsula.

      – «…[*espaço?]no povo portuguez ainda ha o grande brio dos feitos altos, (sussurro). Se ámanhã esta Verdade tão núa fôr ter ao Pelourinho, ninguem sabe até onde o amor da Pátria ha-de crescer! (ovação).

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      Interview com o conselheiro Barahona.

      – V. Ex.a leu alguma vez o Eça?

      – Ler, nunca, mas conheci-o em Evora, delegado do thesouro, e até por causa d'isso vim ao Principe Real

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