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ceticamente. Nunca imaginara que nessa tarde sofreria a primeira derrota de sua vida.

      O noivado de Sylvie Bancroft com o Marquês de Shaw seria anunciado e todos iriam caçoar do "Nunca-nunca-nobre".

      Seus inimigos ririam dele, diriam que, pela primeira vez, Charles Lyndon conhecera o sabor amargo do desprezo de uma mulher.

      As mães ambiciosas, ao contrário, o receberiam de braços abertos e continuariam a lisonjeá-lo na esperança de agarrá-lo para genro.

      «O que farei?», Charles perguntou a si mesmo.

      A ideia de voltar para Londres não o entusiasmava. Podia, naturalmente, ir para a Lyndon Hall, mas isso lhe soava como fuga.

      Em toda a sua vida de militar ele ensinara seus subalternos a jamais se acovardar e a enfrentar o inimigo com destemor. Como poderia agora, ele próprio, ir contra esses princípios?

      Quando ia alcançar a estrada principal que o levaria a Londres, Charles percebeu que o cavalo da frente, à sua direita, diminuíra a marcha. Depressa, conduziu o faetonte para a lateral da estradinha e puxou as rédeas. Os animais pararam por completo.

      O esperto cavalariço logo soube o que havia de errado. Desceu ligeiro do alto banquinho e examinou o cavalo com problema.

      —Raindrop perdeu uma ferradura, sir — informou.

      Felizmente eles se achavam bem perto de uma aldeia. Havia casas dos dois lados da estradinha campestre.

      —Dê uma corrida até a casa mais próxima, Hobson, e pergunte se há algum ferreiro na aldeia— Charles ordenou.

      —Está bem, sir— respondeu o cavalariço, afastando-se correndo.

      Ele ia abrir o portãozinho de um bungalow quando um homem ainda jovem apareceu à porta da casa. Sabendo o que o rapaz desejava, o homem indicou o caminho até uma determinada casa.

      —Aquele homem informou que não há ferreiro por aqui, mas há uma forja na Casa Grande que fica cerca de cem metros distante da aldeia, descendo a estrada, naquela direção— disse Hobson voltando para junto do faetonte e apontando para o leste.

      —Vamos até lá. Se houver ferramentas na forja, você mesmo poderá colocar uma ferradura na pata de Raindrop.

      Hobson voltou para seu assento e Charles tocou os animais. Atravessou a aldeia e pouco depois avistou os grandes portões de uma casa enorme e muito bonita, com graciosas colunas.

      Minutos depois o faetonte subia pelo caminho de entrada da casa, na verdade uma mansão. Só ao chegar perto Charles pôde notar que havia rachaduras nas paredes e muitos dos vidros das janelas estavam quebrados.

      Ele estacionou a carruagem diante dos degraus de entrada, esperou que Hobson segurasse os animais e desceu.

      Por um momento olhou ao redor, certo de que já havia estado naquela propriedade. Era verdade que parecia meio abandonada, mas aquela construção de belíssimas linhas arquitetônicas não lhe era estranha.

      Ele subiu os degraus de pedra. Não havia aldrava na porta da frente da casa, que estava aberta. Parecia não haver ninguém morando ali.

      Charles bateu palmas e aguardou alguns segundos. Não houve resposta. Dispunha-se a bater novamente quando uma mocinha veio atendê-lo.

      Era tão linda que por um momento ele apenas a fitou, emudecido. Notou depois que suas roupas, além de surradas, estavam fora de moda.

      A mocinha pareceu surpresa com o visitante e mesmo tempo, maravilhou-se com o faetonte estacionado à frente da casa.

      —Lamento importuná-la, senhorita, mas um dos meus cavalos perdeu uma ferradura e na aldeia me informaram qué havia uma forja aqui em sua casa— Charles explicou.

      A mocinha sorriu.

      —Sim, claro. Nosso velho cavalariço está nas cocheiras e cuidará de ferrar seu cavalo— disse ela.

      — Por favor, acompanhe-me.

      Ela desceu os degraus e Charles seguiu-a. Ao passar por Hobson pediu-lhe que conduzisse o faetonte atrás deles.

      —Seus cavalos são magníficos— observou a mocinha olhando, cheia de admiração, para as duas parelhas—, espero que haja na oficina uma ferradura do tamanho exato para a pata do seu animal.

      —Tomara que sim— tomou Charles.

      —O senhor deve orgulhar-se de possuir cavalos tão extraordinários— prosseguiu a mocinha.

      —Comprei-os recentemente e hoje, pela primeira vez, vim para o campo com eles. Fiquei muito contente porque a viagem foi feita em tempo recorde. Reconheço que devo ter mais cuidado na volta para Londres. Há trechos da estrada que não estão em boas condições.

      —Todo cuidado é pouco— a mocinha concordou—, principalmente tratando-se de uma carruagem como a sua. Nunca vi um faetonte tão alto. Imagino que seja difícil e, ao mesmo tempo, emocionante conduzi-lo.

      —Sim, é emocionante e exige muita perícia. Faetontes como o meu, do tipo highflyer, são uma verdadeira mania em Londres.

      —Sem dúvida é uma carruagem diferente e muito elegante.

      Eles chegaram às cocheiras e um velho cavalariço apareceu para atendê-los.

      —Um dos cavalos deste cavalheiro perdeu uma das ferraduras, Ben— disse a mocinha—, quem sabe encontraremos uma que se ajuste ao tamanho da pata do animal.

      —Vou dar uma olhada, Srta. Rania. Pode ser que a sorte esteja do lado do cavalheiro. Estamos com falta de ferraduras como de tudo mais— Ben resmungou.

      Á expressão ansiosa da mocinha disse a Charles que a situação em sua casa estava, evidentemente, muito difícil.

      Ben e Hobson examinaram a pata de Raindrop.

      —Posso afirmar que temos uma ferradura perfeita para este belo animal— concluiu Ben depois do exame.

      Rania voltou-se para Charles e convidou-o:

      —O senhor aceitaria uma xícara de chá? Terá ainda um longo caminho pela frente para chegar a Londres.

      —Aceito com prazer, se não lhe der muito trabalho— Charles respondeu, sorridente.

      —Então vamos até a casa. Pode confiar seu cavalo a Ben que é muito experiente.

      —Meu nome é Charles, senhorita— Charles apresentou-se—, ouvi seu cavalariço chamá-la de Rania. Um nome raro.

      —É o que todos dizem. Rania significa "da realeza". Mas como pode ver, nada nesta propriedade sugere realeza.

      Rania sorriu e fez um gesto com as mãos. Charles olhou ao redor e viu que o jardim estava descuidado e cheio de ervas daninhas.

      Ambos entraram na casa cujo estado era deplorável. Notava-se a solidez da construção e a beleza das linhas arquitetônicas, porém o papel estava soltando das paredes e os tapetes gastos haviam perdido a cor original.

      Era de admirar que nas paredes do corredor houvesse telas antigas, com certeza de grande valor.

      Rania abriu a porta de uma sala de estar ampla e mobiliada com peças que seriam lindas, não fosse o péssimo estado em que se encontrava o revestimento. Havia rachaduras na parede e no teto.

      —Fique à vontade e aguarde um instante— pediu Rania—, vou buscar o chá.

      Ela saiu da sala e Charles ouviu-a correndo pelo corredor. Imaginou que se houvesse criados na casa seriam bem poucos.

      Enquanto aguardava ele olhou ao redor, pensativo. Muitas lembranças povoavam-lhe a mente. Ele conhecera uma garota de nome Rania, cujo apelido era Nia.

      Conhecia também aquela casa! No passado era uma mansão suntuosa. Mesmo agora se notava que tudo ali era de bom gosto e boa qualidade. Talvez tivesse sido a guerra a responsável pela pobreza de seus donos.

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