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Feito — gritou através da mordaça.

      — Será que pode calar a boca, seu idiota? Pra quê está gritando? Quer que esses dois capangas voltem aqui e esmurrem a gente de novo?

      — Desculpe — o gordo replicou suavemente. — Mas consegui pegar de verdade.

      — Viu? Com empenho, até você é capaz de ser útil. Deve estar afiada. Veja se consegue cortar essas malditas cordas.

      Com a mão que estava sadia, o gordo agarrou o cabo da espátula e começou a esfregar a ponta mais afiada nas cordas por trás das costas.

      — Supondo que a gente possa ficar livre, — o gordo murmurou, — como vamos fugir daqui? Esta área está cheia de gente e ainda está amanhecendo. Espero que tenha um plano.

      — Claro que tenho! Não sou eu a mente engenhosa por aqui? — exclamou o magro, orgulhoso. — Enquanto você estava tirando uma sonequinha confortável, analisei a situação e achei um meio de dar o fora.

      — Sou todo ouvidos — respondeu o outro, continuando a subir e a descer a espátula.

      — Esse cara da vigia olha aqui pra dentro a cada dez minutos e nossa tenda está no lado leste da área.

      — E daí?

      — Como diabos pude trazer você como parceiro pra este trabalho? Você tem a imaginação e a inteligência de uma ameba; esperando que a ameba não fique ofendida com a comparação.

      — Na verdade — retorquiu o gordo ligeiramente ressentido — fui eu que te escolheu, uma vez que o trabalho foi dado a mim.

      — Conseguiu se libertar? — interrompeu o magro; a discussão estava começando a piorar e seu cúmplice estava absolutamente certo.

      — Preciso de alguns minutos. Acho que vai ceder.

      Logo depois, a corda usada para amarrar os dois ao barril se rompeu e a barriga do gordo, finalmente livre de restrições, retornou ao tamanho normal.

      — Conseguimos! — exclamou o gordo, satisfeito.

      — Excelente. Agora vamos continuar até o guarda voltar. Precisamos fazer com que tudo esteja do mesmo jeito que antes.

      — Ok, parceiro. Vou fingir de novo que estou adormecido.

      Os dois não precisaram esperar muito. Alguns minutos depois, o assistente da doutora estava de volta, para espiar dentro da tenda. Ele deu a olhada habitual em volta, checando o ambiente, e sem notar nada fora do comum, fechou o zíper e então se posicionou novamente na sombra da varanda, calmamente acendendo um cigarro enrolado à mão.

      — Agora — disse o sujeito magro. — Vamos embora.

      Com todas as dores e desconfortos, era mais complicado do que se imaginava, mas depois de soltarem gemidos monótonos de dor e vários palavrões, acabaram frente a frente.

      — Passe a espátula pra mim — ordenou o magro, removendo sua mordaça. As dores no lado direito impediam que se mexesse com facilidade, mas ao colocar sua mão aberta no seu lado, conseguiu aliviar um pouco a dor. Ele alcançou o lado oposto à entrada da tenda com alguns passos, ajoelhou-se e lentamente empurrou a espátula Marshall para dentro. A lâmina afiada da espátula atravessou o pano macio do lado voltado para o leste como manteiga, criando uma pequena fenda de quase dez centímetros. O sujeito magro aproximou o olho direito e espiou pela fenda por alguns instantes. Como esperado, não havia ninguém ali. Somente as ruínas da antiga cidade, a cerca de cem metros, onde, de antemão, haviam escondido o jipe que seria usado para a fuga, com toda a pilhagem.

      — Caminho livre — disse ele, usando a lâmina da espátula para abrir o pequeno corte até o chão. — Vamos! — e rastejou pela fenda.

      — Podia ter feito um buraco maior? — resmungou o gordo, entre um gemido e outro, enquanto tentava, com dificuldade, deslizar para fora.

      — Venha logo! Precisamos fugir depressa.

      — Fácil falar. Mal consigo andar.

      — Deixa disso, se apresse e pare de reclamar. Lembre-se, se não conseguirmos fugir, ninguém impedirá que passemos uns bons anos na cadeia.

      A palavra "cadeia" sempre instigava força extra no sujeito gordo. Ele não falou mais nada, e sofrendo em silêncio, seguiu o companheiro, que se arrastava furtivamente em direção às ruínas.

      Foi o estrondo de um motor à distância que despertou suspeitas do homem da vigia. Olhou para o cigarro agora apagado, então atirou-o para longe com um gesto rápido. Determinado, ele passou para dentro da tenda, mas mal podia acreditar no que via: os dois prisioneiros fugiram. A corda fora deixada de qualquer jeito perto do barril de combustível, um pouco mais adiante estavam os dois pedaços de pano que usaram como mordaças e na parede no fim da tenda, um rasgão que ia até o chão.

      — Hisham, pessoal — berrou o homem com todo o fôlego que tinha nos pulmões. — Os prisioneiros fugiram!

      Astronave Theos – O superfluido

      A imagem do objeto que Petri havia colocado no espaço entre Kodon e a Terra deixou ambos os terráqueos boquiabertos.

      — E o que é essa coisa? — perguntou Elisa com curiosidade, enquanto ia mais perto para enxergar melhor.

      — Ainda não demos um nome oficial — Petri trouxe o estranho objeto de volta ao primeiro plano de novo, e observando a doutora, acrescentou: — Talvez você possa escolher um.

      — Se ao menos você explicasse o que é, talvez eu pudesse tentar.

      — Nossos melhores cientistas se dedicaram a este projeto há um certo tempo — Petri entrelaçou as mãos por trás das costas e começou a andar lentamente pela sala. — Esse equipamento é o resultado de uma série de estudos que, em parte, vão mesmo além das minhas habilidades científicas.

      — E posso lhes garantir que são notáveis — disse Azakis, dando um tapinha afetuoso nas costas do colega.

      — Em poucas palavras, é uma espécie de sistema antigravitacional. Tem base em um princípio que, como disse, ainda está sendo estudado, mas que posso tentar resumir em algumas palavras.

      — Acho que isso seria bem melhor — comentou Elisa. — Não se esqueçam de que pertencemos a uma espécie que, se comparada à sua, pode ser definida facilmente como subdesenvolvida.

      Petri assentiu ligeiramente. Então se aproximou da representação tridimensional do estranho objeto e calmamente continuou a explicação. — Isto – que vocês chamaram de "rosquinha" anteriormente – é geometricamente definido como toroide. O anel tubular é oco, enquanto o que poderíamos simplesmente chamar de "buraco central" contém o sistema de propulsão e de controle.

      — Até aqui, está tudo claro — disse Elisa, cada vez mais empolgada.

      — Muito bem. Agora vamos examinar o princípio de operação do sistema — Petri girou a imagem do toroide e mostrou a seção interna. — O anel é preenchido por um gás, geralmente um isótopo de hélio, que, refrigerado a uma temperatura perto de zero absoluto, muda de estado e se transforma num líquido com características bem particulares. Na prática, sua viscosidade se torna quase nula e pode fluir sem gerar nenhuma fricção. Chamamos essa característica de "superfluidez".

      — Agora estou ficando um pouco perdida — disse Elisa, lamentando.

      — Simplificando, esse gás, em estado líquido, adequadamente estimulado pela estrutura do anel, será capaz de viajar dentro dele, sem nenhuma dificuldade, a uma velocidade próxima à da luz, e conseguirá mantê-la por um período teoricamente infinito.

      — Fantástico — foi tudo o que Jack comentou, e não havia perdido nem uma sílaba de toda a explicação.

      — Ok, agora acho que entendi — acrescentou Elisa. — Mas como essa engenhoca vai combater os efeitos da força gravitacional entre os dois planetas?

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