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Depois Riley e Jilly saíram para o exterior rumo ao frio cortante de Janeiro. Uma fina camada da neve do dia anterior repousava no parque de estacionamento.

      “Então o que te pareceu a tua nova escola?” Perguntou Riley.

      “Bem,” Disse Jilly.

      Riley não conseguia perceber se Jilly estava a ser soturna ou se estava simplesmente atordoada com todas as alterações que tinha que encarar. Ao aproximarem-se do carro, notou que Jilly tremia muito e que os dentes batiam. Usava um casaco pesado de April mas o frio estava mesmo a ser um problema para ela.

      Entraram no carro e Riley ligou a ignição e o ar quente. Mesmo com o carro mais quente, Jilly ainda tremia.

      Riley manteve o carro estacionado. Chegara o momento de descobrir o que incomodava aquela menina que estava ao seu cuidado.

      “O que é que se passa?” Perguntou. “Há alguam coisa na escola que te incomode?”

      “Não é a escola,” Disse Jilly, com a voz agora a tremer. “É o frio.”

      “Bem sei que não faz frio em Phoenix,” Disse Riley. “Isto deve ser estranho para ti.”

      Os olhos de Jilly encheram-se de lágrimas.

      “Às vezes faz frio,” Disse ela. “Sobretudo à noite.”

      “Diz-me o que é que se passa,” Pediu Riley.

      As lágrimas começaram a correr pelo rosto. Ela falava numa vozinha mínima e abafada.

      “O frio faz-me lembrar…”

      Jilly calou-se. Riley esperou pacientemente.

      “O meu pai culpava-me sempre por tudo,” Disse Jilly. “Culpava-me por a minha mãe se ter ido embora, e pelo meu irmão e até me culpava por ser despedido dos empregos que arranjava. Tudo o que corria mal, era sempre culpa minha.”

      Agora Jilly soluçava silenciosamente.

      “Continua,” Disse Riley.

      “Uma noite ele disse-me que queria que eu me fosse embora,” Disse Jilly. “Disse que eu era um peso morto, que eu o atrasava, que já estava farto de mim. Expulsou-me de casa. Fechou as portas e eu não conseguia entrar.”

      Jilly engoliu em seco perante aquela memória.

      “Nunca senti tanto frio na minha vida,” Disse ela. “Nem agora com este tempo. Encontrei um grande tubo de canalização numa vala e era suficientemente grande para eu caber lá dentro, por isso foi lá que passei a noite. Era tão assustador. Às vezes as pessoas andavam por perto mas eu não queria que me descobrissem. Não pareciam pessoas que me ajudassem.”

      Riley fechou os olhos, imaginando a rapariga escondida naquele tubo escuro. Murmurou, “E o que aconteceu depois?”

      Jilly prosseguiu, “Fiquei por lá a noite toda. Não consegui dormir. Na manhã seguinte, voltei para casa e bati à porta e chamei pelo pai e implorei-lhe que me deixasse entrar. Ele ignorou-me, como se eu nem sequer ali estivesse. Foi quando fui para a paragem de camiões. Ali estava quente e havia comida. Algumas das mulheres eram simpáticas comigo e eu pensei que faria qualquer coisa para ficar ali. Foi nessa noite que me encontraste.”

      Jilly acalmou ao contar a sua história. Parecia aliviada por libertar aquele peso de dentro de si. Mas agora Riley chorava. Mal podia acreditar o que aquela pobre rapariga tinha suportado. Colocou o braço à volta de Jilly e abraçou-a com força.

      “Nunca mais,” Disse Riley no meio dos soluços. “Jilly, prometo-te, nunca mais te vais sentir assim outra vez.”

      Era uma grande promessa e Riley sentia-se pequena, fraca e frágil naquele momento. Só esperava poder cumpri-la.

      CAPÍTULO TRÊS

      A mulher não parava de pensar no pobre Cody Woods. Ela tinha a certeza que ele já estaria morto por aquela altura. Saberia, com toda a certeza, pelo jornal da manhã.

      Por muito que estivesse a apreciar o seu chá quente e granola, esperar pelas notícias impacientava-a.

      Quando é que o jornal chega? Pensou, olhando para o relógio da cozinha.

      A entrega parecia estar a atrasar-se cada vez mais nos últimos dias. É claro que não teria estes problemas com uma assinatura digital, mas a verdade era que não gostava de ler o jornal no computador. Gostava de se sentar numa cadeira confortável e desfrutar da sensação antiquada de segurar um jornal nas suas mãos. Ela até gostava da forma como a tinta por vezes ficava agarrada aos dedos.

      Mas o jornal já estava atrasado quinze minutos. Se demorasse muito mais, teria que ligar e fazer uma reclamação. Odiaria ter que o fazer. Amargurava-a.

      De qualquer das formas, o jornal era a única forma que tinha de descobrir o que sucedera a Cody. Não podia simplesmente ligar para o Centro de Reabilitação Signet para saber dele. Isso seria muito suspeito. Para além disso, para o pessoal de lá, ela já estava no México com o marido sem planos para regressar.

      Ou melhor, Hallie Stillians estava no México. Era triste que nunca mais pudesse voltar a ser Hallie Stillians. Tinha-se afeiçoado particularmente àquele pseudónimo. Tinha sido simpático da parte do pessoal do Centro de Signet terem-lhe feito uma surpresa com um bolo no seu último dia no centro.

      Sorriu ao lembrar-se. O bolo tinha sido decorado com sombreros coloridos e uma mensagem:

      Buen Viaje, Hallie e Rupert!

      Rupert era o nome do seu marido imaginário. Iria ter saudades de falar dele de forma tão carinhosa.

      Terminou a sua granola e continuou a bebericar o seu chá caseiro preparado segundo uma antiga receita de família – uma receita diferente da que tinha partilhado com Cody e é claro que sem os ingredientes especiais que tinha acrescentado para ele.

      Começou a cantar ociosamente…

      Longe de casa,

      Tão longe de casa-

      Este bebé pequenino está longe de casa.

      Definha

      De dia para dia

      Demasiado triste para rir, demasiado triste para brincar.

      Como o Cody tinha gostado daquela canção! Também tinham gostado os outros pacientes. E muitos mais pacientes no futuro iriam gostar em igual medida. Aquele pensamento aquecia-lhe o coração.

      E naquele preciso momento, ouviu um baque na porta da frente. Apressou-se para a abrir e olhou para o exterior. Repousado no degrau frio estava o jornal da manhã. A tremer de excitação, apanhou-o, voltou para a cozinha e abriu-o nos anúncios de mortes.

      E lá estava:

      SEATTLE – Cody Woods, 49, de Seattle…

      Parou por um momento naquele ponto. Estranho. Quase podia jurar que ele lhe tinha dito que tinha cinquenta anos. Depois leu o resto…

      … no Hospital South Hills, Seattle, Wash.; Serviços Funerários e de Cremação Sutton-Brinks, Seattle.

      E era tudo. Era conciso, mesmo para um simples anúncio de morte.

      Esperava que houvesse um simpático obituário nos próximos dias, mas estava preocupada que talvez não houvesse. Quem o iria escrever afinal de contas?

      Estivera sozinho no mundo, pelo menos pelo que ela sabia. Uma mulher tinha falecido, outra tinha-o deixado e os dois filhos não lhe falavam. Não lhe dissera mais nada sobre mais ninguém – amigos, familiares, colegas de trabalho.

      Que importa? Interrogou-se.

      Sentiu uma fúria amarga e familiar a subir-lhe na garganta.

      Fúria contra todas as pessoas na vida de Cody Woods que não

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