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– ele poderia ter escolhido Anvin para isso – mas para salvar o seu povo de uma.

      Ela chega a uma decisão.

      "A besta está amaldiçoada," ela afirma com desdém. "Ele quase matou meus irmãos. O javali vem da Floresta de Espinhos e foi morto na véspera da Lua de Inverno, um dia em que somos proibidos de caçar. Foi um erro trazê-lo para dentro de nossos portões – ele deveria ter sido deixado para apodrecer na selva, onde é o seu lugar."

      Ela se vira ironicamente para homens do Governador.

      "Leve-o para o seu Lorde Governador," diz ela, sorrindo. "Você nos fazem um favor."

      Os homens do Governador olham para ela e para o javali, e suas expressões se transformam; eles agora parecem ter mordido algo podre, como se não o quisessem mais.

      Kyra vê Anvin e os outros olhando para ela com aprovação, sentindo-se gratos – seu pai, acima de tudo. Ela havia conseguido – ela tinha permitido que seu povo não fosse envergonhado, poupando-os de uma guerra, e tinha conseguido provocar os Pandesianos ao mesmo tempo.

      Seus irmãos deixar o javali cair no chão, e ele bate na neve com um baque. Eles recuam humilhados, com os ombros claramente doloridos.

      Todos os olhos se voltam para os homens do Governador, que ficam ali parados, sem saber o que fazer. Claramente as palavras de Kyra tinham causado um efeito profundo; eles agora olham para a besta como se o javali fosse algo sujo que tinha sido arrastado para fora das entranhas da terra. Obviamente, eles já não o querem. E agora que o animal lhes pertence, eles parecem ter perdido todo o interesse nele.

      O comandante, depois de um longo e tenso silêncio, finalmente faz um gesto para que seus homens peguem o animal, em seguida, ele lhes dá as costas, carrancudo, e marcha para longe, claramente irritado, como se soubesse que tinha sido enganado.

      A multidão se dispersa, a tensão desaparece e é substituída pela sensação de alívio. Muitos dos homens de seu pai se aproximam dela com aprovação, colocando as mãos em seus ombros.

      "Muito bem," Anvin diz, olhando para ela com aprovação. "Você será uma boa governante algum dia."

      O povo da aldeia retoma seus afazeres, a tensão se dissipa, e Kyra se vira e começa a procurar os olhos de seu pai. Ela o encontra olhando para ela, em pé a poucos metros de distância. Na frente de seus homens, ele era sempre reservado em relação a ela, e desta vez não é diferente – ele carrega uma expressão indiferente, mas ele acena ligeiramente para ela, um aceno de cabeça que, ela sabe, comunica sua aprovação.

      Kyra olha e vê Anvin e Vidar, segurando suas lanças, e seu coração acelera.

      "Posso me juntar a vocês?" Ela pede para Anvin, sabendo que eles estão indo para os campos de treinamento, assim como o resto dos homens de seu pai.

      Anvin olha nervosamente para seu pai, sabendo que ele não aprovaria.

      "A neve está ficando mais forte," Anvin finalmente responde hesitante. "Está anoitecendo, também."

      "Isso não está impedindo a sua partida," Kyra rebate.

      Ele sorri pra ela.

      "Não, não está," ele admite.

      Anvin olha mais uma vez para o pai dela, e ela vê quando ele sacode a cabeça negativamente, antes de se virar e voltar para dentro.

      Anvin suspira.

      "Eles estão preparando uma festa grandiosa," ele fala. "É melhor você ir."

      Kyra já pode sentir o cheiro do banquete, o ar está pesado com o cheiro das carnes finas assando, e ela vê seus irmãos entrarem, junto com dezenas de moradores, todos correndo para se preparar para o festival.

      Mas Kyra se vira e olha longamente para os campos de treinamento.

      "Uma refeição pode esperar," ela diz. "O treinamento não pode. Deixe-me ir."

      Vidar sorri e balança a cabeça.

      "Tem certeza que você é uma menina e não um guerreiro?" Pergunta Vidar.

      "Eu não posso ser os dois?" Ela responde.

      Anvin deixa escapar um longo suspiro e, finalmente, balança a cabeça.

      "Seu pai vai pedir minha cabeça por isso," ele diz.

      Então, finalmente, ele assente.

      "Você não vai aceitar um não como resposta," conclui ele, "e você tem mais coragem do que metade dos meus homens. Acho mais uma pessoa não vai nos prejudicar."

*

      Kyra corre em meio à neve na trilha de Anvin, seguida por Vidar e vários dos homens de seu pai e com Leo ao seu lado, como de costume. A neve se intensifica, mas ela não se importa. Ela sente uma sensação de liberdade e alegria, como sempre tinha ao passar pelo Portal dos Lutadores, uma abertura em arco nas paredes de pedra na entrada do campo de treinamento. Ela respira fundo quando o céu se abre, e entra correndo no lugar que ela mais ama no mundo, com suas colinas verdes, agora cobertas de neve, cercadas por uma parede de pedra com quase um quarto de milha de largura e profundidade. Ela tem a sensação de que tudo está exatamente como deveria ser ao ver todos os homens em treinamento, atravessando o campo em seus cavalos, empunhando lanças, apontando para alvos distantes e aprimorando suas habilidades. Isso, para ela, é o significado de viver.

      Aquele campo de treinamento é reservado para homens de seu pai; e mulheres não podiam entrar ali, nem os meninos que ainda não tinham atingido dezoito anos – e que não tinham sido convidados. Brandon e Braxton, todos os dias, esperam com impaciência para serem convidados – e Kyra suspeita que isso nunca vá acontecer. O Portal dos Lutadores é para guerreiros honrosos e endurecidos pela batalha, e não para perdedores como seus irmãos.

      Kyra corre pelos campos, sentindo-se mais feliz e viva ali do que em qualquer outro lugar na Terra. A energia é intensa e se mistura às dezenas dos melhores guerreiros de seu pai, todos vestindo armaduras um pouco diferentes, vindos de todas as regiões de Escalon, guerreiros que ao longo do tempo haviam se dirigido ao Forte de seu pai. Há homens do sul, de Thebus e Leptis; das Midlands, a parte vinda da capital, Andros, mas também das montanhas de Kos; há ocidentais de Ur; homens ribeirinhos de Thusis e seus vizinhos de Esephus. Há homens que moravam perto do Lago de Ire, e os homens de lugares tão distantes como as cachoeiras em Everfall. Todos usam armaduras de cores diferentes, empunham armas diferentes, todos eles homens de Escalon, ainda que representassem seu próprio reduto. É um conjunto deslumbrante e variado de poder.

      Seu pai, o ex-campeão do rei, um homem que comanda grande respeito, é o único homem nestes tempos, neste reino em frangalhos, a quem os homens poderiam recorrer. Na verdade, quando o antigo rei havia rendido seu reino sem oferecer resistência, foi o pai dela que as pessoas haviam pressionado a assumir o trono e liderar a luta. Com o tempo, os melhores guerreiros do antigo rei o tinham procurado, e agora, com sua força crescendo a cada dia, Volis tinha alcançado uma força que quase rivalizava com a da capital. Talvez fosse por isso, Kyra percebe, que os homens do Governador sentiam a necessidade de humilhá-los.

      Em outros lugares em toda Escalon, o Lorde Governadores de Pandésia não permite que os cavaleiros se reúnam, não permitindo tais liberdades por medo de uma revolta. Mas ali, em Volis, é diferente. Ali, eles não têm escolha: eles precisam permitir aquilo, porque eles precisam dos melhores homens possíveis para manter as Chamas.

      Kyra se vira e olha além das paredes, além das colinas cobertas de branco e, ao longe, no horizonte distante, mesmo através da neve, ela pode ver, por pouco, o brilho ofuscante das Chamas. A parede de fogo que protege a fronteira ocidental de Escalon, as Chamas, uma parede de fogo de cinquenta pés de profundidade e várias centenas de pés de altura, ardendo com tanta intensidade quanto sempre, iluminando a noite, seu contorno visível no horizonte e se tornando mais pronunciado à medida que a noite cai. Com quase oitenta quilômetros de largura, as chamas são a única coisa permanente entre Escalon e a nação de trolls selvagens a leste.

      Mesmo assim, trolls suficientes conseguem atravessá-las a cada ano para criar o caos, e se não fosse pelos Guardiões, bravos homens de

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