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à noite; logo depois, uma de nossas equipes foi pra lá imediatamente pra coletar amostras. Afetou duas pessoas, um casal de idosos. A mulher morreu algumas horas depois do contágio, que foi entre duas e seis horas antes; o marido ainda tá vivo. A prioridade desse vírus é nível nove. E, por último, temos esse outro vírus – Norberto pegou uma garrafa cilíndrica contendo um líquido azul-claro. —, que vem de uma montanha fria da Noruega. Foi descoberto por acaso. Um alpinista tava passeando nas montanhas quando começou a se sentir mal e a sangrar pela boca. Ele correu o máximo que pôde até um abrigo de montanhistas, onde, já inconsciente, foi levado pra um hospital. O alpinista chegou ao hospital em parada cardíaca. Por sorte, conseguiram fazer a reanimação, e ele ainda tá vivo. Todos os alpinistas do abrigo começaram a sofrer os mesmos sintomas minutos depois, assim como aqueles que tavam no hospital naquele momento. Algumas horas depois, o hospital tava em quarentena, e continua até agora.

      – Meu Deus, quantos infectados temos agora? – perguntou Keysi, que estava boquiaberta.

      – Umas quinhentas pessoas até essa manhã, pode ser que agora já tenha alcançado mil. É muito contagioso, e o pior é que não sabemos a forma como se espalha.

      – Quando tudo isso aconteceu? – perguntou Carolina.

      – Ontem à tarde. Sairá no jornal do meio-dia. Tem prioridade dois. Meninas, ao trabalho.

      – Espere, por que temos uma amostra desse vírus tão rápido? – perguntou Carolina.

      – Nos enviaram de um laboratório da Noruega. Segundo eles, somos os melhores.

      O laboratório de Norberto, O Farol da Luz, tinha prestígio internacional. Para trabalhar lá, primeiro era necessário passar por uma série de exames teóricos e práticos muito exigentes.

      A pesquisa de antígenos tinha um grau de prioridade de um a nove, sendo um o maior grau. No início, o nível da prioridade foi delimitado pelo número de mortes, que depois foi alterado para o número de infectados, até que, no final, cada laboratório passou a escolher a prioridade de acordo com seu próprio sistema. O laboratório de Norberto escolhia a prioridade de encontrar um antígeno com base em cálculos que projetassem o número de infectados e mortos nos próximos dias.

      Keysi fazia anotações de tudo o que Norberto tinha dito em uma agenda, e logo compartilhava com Carolina. A inglesa tinha uma memória eidética, por isso não precisava fazer anotações enquanto Norberto falava.

      Aquele dia seria duro. Eles tinham trazido cinco vírus; poderia demorar horas, dias, semanas ou meses para descobrir os antígenos. Cada segundo era importante. A vida ou a morte de várias pessoas dependia de gente como elas.

      Keysi então voltou ao vírus com o qual estava trabalhando antes de Norberto aparecer; era de prioridade dois, e ela estava prestes a encontrar o antígeno.

      – Acho que consegui – disse Keysi.

      – O quê? – perguntou Carolina, que estava imersa em seus pensamentos.

      – O antígeno para o vírus de Cancún. Vou mandar para Norberto testar, já temos trabalho suficiente.

      – Você não vai procurar outros possíveis antígenos? – Keysi estava sempre procurando por vários antígenos.

      – Carolina, eu tô nervosa, muita gente tá morrendo, temos que nos apressar.

      – Keysi, se acalme, desse jeito você não vai ajudar. Se quiser, pode tirar o dia de folga.

      – Tirar o dia de folga? Com esse caos? – perguntou a inglesa, perdendo a paciência.

      – Nesse caso, vá pra cafeteria, tome um café, relaxe. Se quiser, ligue pro seu namorado – Keysi fez uma careta. – e depois, quando tiver melhor, volte.

      – Tá bom, vou ligar pra Clara – Clara era a secretária de Norberto, que atuava como garota de recados.

      A secretária de Norberto entrou na sala depois de alguns minutos.

      – Clara, leve esse antígeno pra Norberto, diga a ele que tá pronto pros testes, e que esse é o de Cancún.

      – Clara, diga também a Norberto que eu gostaria de ter uma cópia dos relatórios do hospital do alpinista norueguês e o do caso zero da Austrália – disse Carolina.

      Keysi seguiu o conselho de Carolina e foi tomar alguma coisa na sala que era usada para relaxar, mas ela não ligaria para o namorado, com quem tinha discutido, talvez pela última vez.

      Keysi voltou para o local onde trabalhava, a Sala 4. Carolina já tinha começado a trabalhar com o vírus da Índia.

      A britânica ficou ali, com a porta aberta, olhando para sua colega. Carolina se virou e olhou para ela, sem entender nada. Naquele momento, a britânica começou a chorar, então Carolina foi até ela e a abraçou.

      – O que aconteceu, Keysi?

      – Meu namorado me largou.

      Carolina tinha visto o namorado de sua colega poucas vezes, em festas de Natal e em algum outro evento no laboratório. Ele parecia um rapaz muito atraente, mas um pouco antipático.

      – Talvez ele não fosse o melhor cara para você.

      – Carolina, eu sei que ele não era, mas isso não facilita as coisas. Eu deixei toda a minha vida na Inglaterra por ele, aprendi espanhol e vim morar em Maiorca com ele.

      – Não tem mais volta?

      – Não tem mais volta? – repetiu Keysi. – Eu não quero que tenha volta.

      – Eu pensei que vocês tavam indo bem.

      – A gente tava, até que no ano passado eu fiquei grávida.

      – Eu não sabia disso – Carolina estava surpresa.

      – Nem eu, até que era muito tarde. Uma noite, meu namorado levantou à meia-noite pra pegar um copo d'água. A cama tava cheia de sangue; aparentemente eu tava sangrando porque algo não tava funcionando dentro de mim. Eu tava tendo um aborto e nem sabia que tava grávida. Tava de dois meses. Tudo aconteceu muito rápido. Nos dias seguintes, eu tava triste, mas tudo continuava do mesmo jeito. – Keysi fez uma pausa. – A gente devia continuar.

      – Claro – respondeu Carolina.

      Essa tinha sido a conversa mais íntima que as duas colegas haviam tido, e também a mais longa. As duas continuaram trabalhando. Keysi adorava Richard Wagner, então Carolina foi ao computador e colocou uma playlist de Wagner, sem dizer nada.

      Elas decidiram que cada uma criaria um antígeno para todos os cinco vírus, compartilhando informações para acelerar o processo.

      2. Sou uma sobrevivente

      Eram dez da manhã. Mónica tinha deixado seu filho pequeno, Samuel, na escola. Naquele dia, chegou mais tarde porque tinha um check-up marcado com o médico. Samuel nasceu como qualquer outra criança, mas algo mudou com dois meses de vida. Samuel estava ficando cego, e o avô de Mónica também era cego. Graças ao progresso da medicina, uma operação simples foi suficiente para parar a cegueira e recuperar a visão perdida. Samuel tinha que ir ao médico a cada seis meses para verificar se a visão estava perfeita.

      Mónica estava caminhando para sua casa, pensativa. Ele estava desempregado, mas recebia uma pensão como viúva. Ele tinha que pagar o aluguel da casa em que morava com seus dois filhos, Samuel e Óscar, as contas do mês, o uniforme das aulas de karatê de Samuel e todas as despesas em geral. Seu marido tinha morrido de parada cardíaca quando detectaram a cegueira precoce de Samuel; infelizmente, não havia cura para tudo.

      O seu marido era o pai de Samuel. O pai de Óscar era um antigo namorado da escola que ela não suportava. Pedir ajuda financeira era a última coisa que pensava em fazer.

      Para Samuel, que tinha quatro anos, seu irmão mais velho era como um pai, mesmo que ainda faltassem vários dias para que ele atingisse a maioridade.

      Antes de voltar para casa, ela encontrou uma de suas vizinhas, que tinha comprado um carro novo muito caro, que sempre havia sido a obsessão

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