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fazendo-a transpirar.

      Finalmente, eles chegaram à Praça do Chafariz. Ao passarem pelas tendas, um comerciante foi atrás deles, oferecendo-lhes uma grande cesta de alimentos por metade do preço.

      Sartes sorriu de orelha a orelha – o que ela achou um pouco estranho - e, em seguida, ele ergueu uma moeda de cobre com o seu braço saudável.

      "Acho que te devo um pouco de comida", disse ele.

      Ceres engasgou-se em estado de choque. "Onde é que conseguiste isso?"

      "Aquela miúda rica na carruagem dourada atirou para fora duas moedas, não uma, mas as pessoas todas estavam tão focadas na luta entre os homens que nem sequer notaram”, respondeu Sartes, com o seu sorriso ainda muito intacto.

      Ceres zangou-se e preparou-se para confiscar a moeda a Sartes e atirá-la. Aquilo era dinheiro de sangue, afinal. Eles não precisavam de nada que viesse de pessoas ricas.

      Ao se aproximar para a agarrar, de repente, uma mulher velha apareceu e bloqueou-lhe a passagem.

      "Tu!", disse ela, apontando para Ceres, com uma voz tão alta que Ceres sentiu-a como se vibrasse diretamente através dela.

      A tez da mulher era ligeira, mas aparentemente transparente, e os seus lábios perfeitamente arqueados tinham uma tonalidade esverdeada. Bolotas e musgos adornavam o seu longo e espesso cabelo preto, e os seus olhos castanhos combinavam com o seu longo vestido castanho. Ela era bonita de se ver, Ceres pensou, tanto que ela ficou hipnotizada por um momento.

      Ceres pestanejou, atordoada, certa de que nunca havia conhecido aquela mulher antes.

      "Como é que sabes o meu nome?"

      O seu olhar prendeu-se no da mulher e quando ela deu alguns passos na sua direção, Ceres reparou que a mulher cheirava fortemente a mirra.

      "Veia das estrelas", disse ela, numa voz estranha.

      Quando a mulher levantou o braço num gesto gracioso, Ceres viu que uma triquetra estava marcada no lado de dentro do seu pulso. Uma bruxa. Com base no aroma dos deuses, talvez uma vidente.

      A mulher pegou no cabelo rosa dourado de Ceres e cheirou-o.

      "Tu não és nenhuma estranha para a espada", disse ela. "Tu não és nenhuma estranha para o trono. O teu destino é grandioso, na verdade. Poderosa será a mudança."

      De súbito, a mulher virou-se e foi-se embora a correr, desaparecendo por detrás da sua tenda. Ceres ficou ali, entorpecida. Ela sentiu as palavras da mulher a penetrarem a sua alma. Sentiu que tinham sido mais do que uma observação; eram uma profecia. Poderosa. Mudança. Trono. Destino. Eram palavras que ela nunca tinha associado a si própria antes.

      Poderiam elas ser verdade? Ou eram apenas as palavras de uma louca?

      Ceres olhou e viu Sartes a segurar uma cesta de alimentos, com a sua boca já recheada com pão mais do que suficiente. Ele estendeu-a para ela. Ela viu pastelaria, frutas e legumes, sendo quase o suficiente para quebrar a sua determinação. Numa situação normal ela teria devorado a comida.

      No entanto, agora, por alguma razão, ela tinha perdido o apetite.

      Havia um futuro à sua frente.

      Um destino.

      *

      A caminhada para casa tinha levado quase uma hora a mais do que o habitual. Permaneceram todos em silêncio durante todo o caminho, cada um perdido nos seus próprios pensamentos. Ceres só conseguia pensar no que as pessoas que ela mais amava no mundo pensavam dela. Ela mal sabia o que pensar de si mesma.

      Ela olhou para cima e viu a sua humilde casa, ficando surpreendida por ter conseguido fazer todo o caminho, dada a forma como a cabeça e as costas lhe doíam.

      Os outros haviam-se separado dela há algum tempo, para fazer um recado ao seu pai, e Ceres entrou sozinha na soleira que rangia, preparando-se, esperando não encontrar a sua mãe.

      Ela entrou num banho de calor. Dirigiu-se para o pequeno frasco de álcool de limpeza que a sua mãe tinha guardado sob a sua cama e tirou-lhe a rolha. Fê-lo com cuidado para não usar demais senão podia ser detetado. Preparando-se para a picada, ela arrancou a sua camisa e derramou-o pelas costas.

      Ceres gritou de dor, cerrando o punho e inclinando a cabeça contra a parede, sentindo mil picadas das garras do omnigato. Ela sentia como se aquelas feridas nunca se fossem curar.

      A porta abriu-se com força e Ceres encolheu-se. Ela ficou aliviada ao ver que era apenas Sartes.

      "O Pai precisa de ter ver, Ceres", disse ele.

      Ceres notou que os seus olhos estavam ligeiramente vermelhos.

      "Como é que está o teu braço?", perguntou ela, assumindo que ele estava a chorar de dor por causa do seu braço ferido.

      "Não está partido. Apenas torcido". Ele aproximou-se e o seu rosto ficou sério. "Obrigado por me teres salvado hoje."

      Ela ofereceu-lhe um sorriso. "Como é que eu poderia estar em outro lugar?", disse ela.

      Ele sorriu.

      "Vai ter com o Pai agora", disse ele. "Eu vou queimar o teu vestido e o pano."

      Ela não sabia como ela seria capaz de explicar à sua mãe como é que o seu vestido, de repente, tinha desaparecido, mas a peça de roupa herdada definitivamente tinha de ser queimada. Se a sua mãe a encontrasse no seu atual estado - ensanguentado e cheio de buracos – não haveria quem conseguisse dizer o quão severa a punição seria.

      Ceres foi-se embora, caminhando pelo trilho de ervas espezinhadas para o telheiro atrás da casa. Restava uma árvore no seu humilde lote - as outras haviam sido cortadas em lenha e queimadas na lareira para aquecer a casa durante as noites frias de Inverno - e os seus ramos pairavam sobre a casa como uma energia protetora. Toda vez que Ceres a via, ela lembrava-se da sua avó, que falecera dois anos antes. Tinha sido a sua avó que tinha plantado a árvore quando ela era criança. Era o seu templo, de certa forma. E do seu pai também. Quando a vida se tornava demasiado difícil de suportar, eles ficavam sob as estrelas e abriam os seus corações para Nana como se ela ainda estivesse viva.

      Ceres entrou no telheiro e cumprimentou o seu pai com um sorriso. Para sua surpresa, ela reparou que a maioria das suas ferramentas haviam sido retiradas da mesa de trabalho e que não havia espadas a aguardar junto da lareira para serem forjadas. Ela não se conseguia lembrar de ver o chão tão bem varrido ou as paredes e o teto sem ferramentas.

      Os olhos azuis do seu pai iluminaram-se, como sempre acontecia quando ela a via.

      "Ceres", disse ele, levantando-se.

      Naquele último ano, o seu cabelo escuro tinha ficado muito mais grisalho assim como a sua curta barba, e as bolsas sob os seus olhos amorosos tinham duplicado de tamanho. No passado, tinha sido de estatura larga e quase tão musculado quanto Nesos; no entanto, recentemente, Ceres notava que ele tinha perdido peso e a sua postura, anteriormente perfeita, estava a ceder.

      Ele foi ter com ela à porta e colocou uma mão calejada nas suas costas.

      "Vem comigo."

      O peito dela comprimiu-se um pouco. Quando ele queria falar e andar, isso significava que ele estava prestes a compartilhar algo significativo.

      Lado a lado, eles vaguearam até à parte traseira do telheiro e na direção do pequeno campo. Não muito longe apareciam umas nuvens escuras, enviando rajadas de vento quente e temperamental. Ela esperava que elas produzissem a chuva necessária para recuperarem daquela seca aparentemente interminável, mas como já antes acontecera, elas provavelmente apenas contivessem vazias promessas de chuviscos.

      A terra rangia sob os seus pés enquanto ela caminhava, com o solo seco, as plantas amarelas, castanhas e mortas. Aquele pedaço de terra atrás da sua subdivisão era do Rei Claudius, apesar de não ser semeada há anos.

      Eles subiram uma colina e pararam, olhando através do campo. O pai dela permanecia em

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