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não ia falar do assunto com um dos seus seguidores. Portanto, experimentou um sorriso frio.

      – Porque não me leva até ele? Poderá dizer-lhe.

      – Menina, não vou dizer-lhe outra vez. Vá-se embora. Saia desta colina e nunca mais volte.

      – Não vou fazer isso – declarou Susannah, com a firmeza que aprendera a desenvolver nos últimos anos. Como se esperasse que as suas ordens fossem obedecidas sem ser questionadas. Como se fosse o próprio Leonidas em vez da jovem viúva que todos sabiam que nunca devia ter ficado com o controlo de nada e muito menos de toda aquela fortuna.

      Porém, Susannah fizera exatamente o que a mãe lhe dissera. Ficara com o apelido de Leonidas e com a sua autoridade. Confundira as pessoas da corporação que o marido deixara para trás utilizando a atitude.

      – Tenho de ver o Conde. Isso é inegociável. Faça o que tiver de fazer para isso.

      – Oiça, menina…

      – Ou pode dar-me um tiro – sugeriu Susannah, com frieza. – Mas essas são as duas únicas opções possíveis.

      O homem pestanejou como se não soubesse o que fazer. Susannah não podia culpá-lo. Ela não se acovardara. Não lhe dera nenhuma indicação de que não estivesse completamente tranquila. Limitara-se a ficar onde estava como se estar no meio de uma montanha do Idaho fosse o mais normal do mundo.

      Observou fixamente para o homem até ficar claro que era ele que estava incomodado.

      – Quem raios é? – perguntou o homem, finalmente.

      – Ainda bem que pergunta – disse Susannah. E, dessa vez, o seu sorriso era menos frio. Parecia uma arma que aprendera a disparar durante aqueles últimos quatro anos. – Sou a esposa do Conde.

      Capítulo 2

      O conde não tinha esposa.

      Pelo menos, que ele recordasse. Mas aquele era o problema com tudo, não era? Naqueles dias, incomodava-o mais que houvesse tantas coisas que não recordava.

      Havia mais coisas que não conseguia recordar do que o contrário. E todas tinham acontecido nos últimos quatro anos.

      Os seus seguidores contavam histórias de como tinham encontrado aquele lugar. Como cada um deles chegara, subindo a montanha e demonstrando que eram dignos de estar ali. Falavam do que tinham deixado para trás. As pessoas, os lugares. Os sonhos e expectativas.

      No entanto, a única coisa que o Conde conhecia era aquele acampamento.

      A sua primeira lembrança era de quando acordara nos aposentos grandes que ainda ocupava. Estava magoado, quebrado. Demorara muito tempo a recuperar algo parecido com a saúde. Sentar-se e, depois, levantar-se. Mais tarde, começara a andar lenta e dolorosamente. E quando, finalmente, pôde andar sozinho, tinha a sensação de que o seu corpo não era como antes. Embora só pudesse imaginar.

      Demorara quase dezoito meses a sentir-se mais ou menos normal. E outros dezoito a perceber que, por muito que tentasse, não sabia realmente o que era «normal».

      Porque continuava sem conseguir lembrar-se de nada que não fosse aquele lugar.

      As pessoas diziam que estava destinado. Que tudo fazia parte do mesmo plano glorioso. Encontravam-se para rezar e, então, aparecera um líder no mesmo bosque em que viviam. Fim do assunto.

      O Conde concordara porque não tinha nenhuma razão para não o fazer.

      Certamente, sentia-se como um líder. Sentia-se assim desde que abrira os olhos. Quando dava uma ordem e as pessoas a cumpriam, não era novo para ele, mas profundamente familiar.

      Não costumava partilhar com ninguém como gostava quando as coisas lhe eram familiares. Parecia-lhe aproximar-se demasiado de admitir algo que não queria.

      Todos os seus desejos eram atendidos. As pessoas reuniam-se para o ouvir falar. Preocupavam-se com a sua saúde. Alimentavam-no, vestiam-no e seguiam-no. O que mais é que um homem podia desejar?

      E, no entanto, havia uma mulher no acampamento que garantia ser a sua esposa. O Conde sentia-se como se algo que não soubesse que tinha se abrisse de repente.

      – É muito insistente – disse Robert, o seu conselheiro mais próximo. – Diz que está à tua procura há algum tempo.

      – Mas não tenho esposa – replicou o Conde. – Não lho disseste desde o começo?

      Robert era o único que estava ao seu lado naquele momento a ver a mulher em questão através dos monitores que tinham à sua frente. O Conde esperou para ver se sentia alguma coisa familiar. Esperou para ver se a conhecia, mas, como tudo na sua vida, não havia conhecimento. Não havia lembranças.

      Às vezes, dizia às pessoas que agradecia ser uma tela em branco. Mas havia outras vezes, como aquela, em que as coisas que não sabia e não sentia o perseguiam como uma tempestade de inverno.

      – Claro que não tens esposa – replicou Robert, escandalizado. – Esse não é o teu caminho. Isso é para homens vulgares.

      Aquele era um lugar de pureza. Era uma das poucas coisas que sempre tinham estado claras para o Conde e era muito útil que nunca tivesse sentido a tentação de se desviar do caminho. Homens e mulheres praticavam a mesma pureza radical do que ele, a menos que tivessem dispensa por serem casados, ou iam-se embora.

      Porém, durante todo aquele tempo, quando o Conde olhava para uma mulher, não sentira nada senão aquela pureza.

      Até agora.

      Demorou um instante a perceber o que estava a acontecer-lhe e supôs que devesse sentir-se horrorizado. Mas não foi assim. O desejo atravessou-o como um velho amigo e não soube porquê, mas não houve nenhum alarme de aviso. Pensou que a tentação era boa, como se fosse mais poderoso pelo facto de a vencer. Pensou que aquilo era apenas um teste.

      A mulher que ocupava os ecrãs parecia impaciente. Aquilo era a primeira coisa que a diferenciava das mulheres que viviam ali. E mais do que isso, parecia… frágil. Não era curtida como as pessoas dali, nem pronta para qualquer eventualidade. Parecia suave.

      O Conde não soube porque queria tocar nela para ver se era tão suave como parecia.

      Vestia uma roupa que não tinha sentido para ele no topo da montanha. Não recordava ter estado noutro sítio, é claro, mas sabia que havia um mundo lá fora. Tinham-lhe dito. E aquela vestimenta preta e sedosa fê-lo pensar em cidades.

      E, quando o fez, foi como se todas surgissem na sua mente como um catálogo de viagens: Nova Iorque. Londres. Xangai. Nova Deli. Berlim. Cairo. Auckland.

      Como se tivesse estado em todas e cada uma delas.

      Afastou aquele pensamento e observou a mulher. Tinham-na levado para o interior do acampamento, para uma sala fechada a que nunca tinham chamado calabouço. Mas era. Só tinha um sofá velho, uma casa de banho atrás de um biombo e câmaras nas paredes.

      Se a mulher estava tão incomodada como os últimos três agentes que tinham ido visitá-los, não se notava. Estava sentada no sofá como se nada fosse. Tinha o rosto perfeitamente tranquilo e os olhos azuis serenos. Parecia serena e isso chamou-lhe a atenção sobre o facto de ser bonita de um modo quase incompreensível.

      Não era que tivesse muitas mulheres com que pudesse compará-la. Mas, de certo modo, o Conde soube que, se pusesse todas as mulheres do mundo que não conseguia recordar em fila, continuaria a achar aquela espetacular.

      Tinha as pernas compridas e bem torneadas, mesmo com as botas, e cruzava-as com decoro como se não tivesse percebido que estavam manchadas de lama. Usava um único anel na mão esquerda que captava a luz quando se mexia. A sua boca chamou-lhe a atenção de um modo que não conseguia entender, criando uma espiral de desejo no seu interior que não sabia bem se achava agradável. Para desviar a atenção, concentrou-se no cabelo loiro brilhante que apanhara na nuca de um modo complicado.

      «Um

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