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sorriu levemente.

      - Então você acha que é isso o que você vai fazer? Você vai ver se a volta ao trabalho pode ajudar você a se livrar dessas dúvidas e culpas sobre si mesma?

      - Logo, logo – Avery disse, pensando na ligação de Connelly, dois dias antes. – Sim, acho que pode ajudar.

      - Bom, te desejo sorte - Higdon disse, estendendo a mão para cumprimentar Avery. - Enquanto isso, sinta-se à vontade para me ligar se precisar de algo.

      Avery apertou a mão de Higdon e saiu do consultório. Ela odiava admitir, mas estava se sentindo melhor do que nas últimas semanas—desde quando havia finalmente encontrado uma rotina de exercícios físicos e da mente. Percebeu que, agora, poderia pensar mais claramente, e não porque Higdon tinha descoberto alguma verdade escondida. Avery precisava simplesmente que alguém a dissesse que, mesmo que Rose fosse a única pessoa restante em sua vida fora do trabalho, aquilo não significava que seu medo de como Rose a via deveria ditar como ela viveria o resto de sua vida.

      Avery entrou em seu carro e dirigiu de volta até sua casa. Ela viu os prédios altos de Boston ficando para trás. A sede do A1 ficava a cerca de vinte minutos dali. Ela poderia ir até lá, visitar a todos e ser bem recebida. Poderia simplesmente tirar o curativo e ir até lá.

      Mas ela não merecia ser bem recebida. Na verdade, ela não sabia o que merecia.

      E talvez era daí que vinha sua hesitação.

      ***

      O pesadelo daquela noite não era novo, mas havia apresentado uma mudança na história.

      Nele, Avery estava em uma sala de visitação de uma prisão. Não era a mesma onde ela havia visitado Howard Randall algumas vezes, mas sim algo muito maior e quase com aparência grega. Rose e Jack estavam na mesa, com um tabuleiro de xadrez entre eles. Todas as peças seguiam no tabuleiro, mas os reis estavam caídos.

      - Ele não está aqui – Rose disse, com sua voz ecoando pela sala. – Sua pequena arma secreta não está aqui.

      - É isso – Jack disse. – Já é hora de aprender a resolver seus maiores casos sozinha.

      Jack então passou uma mão pelo rosto e, num piscar de olhos, estava exatamente como Avery tinha encontrado seu corpo no dia de sua morte. O lado direito do rosto estava lavado de sangue. Quando ele abriu a boca para falar, não havia língua em sua boca. Havia apenas uma escuridão entre os dentes, um abismo de onde vinham suas palavras e onde, Avery suspeitava, Jack queria que ela estivesse.

      - Você não conseguiu me salvar – ele disse. – Não conseguiu me salvar e agora eu tenho que confiar minha filha a você.

      Rose levantou-se nesse momento e começou a se afastar da mesa. Avery levantou-se também, certa de algo muito ruim aconteceria se Rose saísse de seu campo de vista. Ela tentou seguir sua filha, mas não conseguiu se mover. Olhou para baixo e viu que seus dois pés estavam pregados no chão com pregos de estradas de ferro. Seus pés estavam machucados, uma mistura de sangue, ossos e carne.

      - Rose!

      Mas sua filha apenas olhou para trás, sorrindo e acenando. E quanto mais longe ela ia, maior a sala parecia. Sombras vinham de todas as direções enquanto Rose diminuía.

      - Rose!

      - Tudo bem – uma voz disse atrás de Avery. – Eu vou cuidar dela.

      Ela virou-se e viu Ramirez, segurando sua arma e olhando para as sombras. Ramirez começou a seguir Rose, e as sombras vieram atrás dele.

      - Não! Fique!

      Avery tentou sair do chão, mas seus pés seguiam trancados. Ela pode apenas ver as duas pessoas que mais amava no mundo sendo engolidas pela escuridão.

      E nessa hora ela começou a gritar, fugindo da sombra, com Rose e Ramirez sumindo da sala, tomada por gritos de agonia.

      Ainda à mesa, Jack disse:

      - Pelo amor de Deus, faça algo!

      Foi nesse momento que Avery pulou na cama, com um grito saindo de sua garganta. Ela acendeu o abajur com as mãos tremendo. Por um momento, não pode entender o quarto enorme a sua frente, mas logo seus olhos se acostumaram com a luz. Olhou em volta pelo quarto e, pela primeira vez, perguntou-se se um dia se sentiria em casa ali.

      Avery encontrou-se pensando na ligação de Connelly. E depois na encomenda de Howard Randall.

      Sua antiga vida estava a assombrando, claro, mas além disso, estava invadindo a nova vida, isolada, que ela estava tentando construir.

      Parecia não haver escapatória.

      Então talvez—apenas talvez—fosse hora de escapar.

      CAPÍTULO CINCO

      Ao decidir parar de beber muito durante o período mais triste de seu processo de luto, Avery havia começado vagarosamente a trocar o álcool por cafeína. Suas sessões de leitura geralmente eram acompanhadas de duas xícaras de café com uma Coca Diet entre elas. Por conta disto, ela havia começado a sentir pequenas dores de cabeça quando passava mais de um dia sem café. Não era a maneira mais saudável de viver, mas com certeza era melhor do que ingerir álcool todos os dias.

      Por isso Avery foi até uma cafeteria depois do almoço no dia seguinte. Ela havia saído de casa para ir à mercearia porque estava sem café em casa, mas como só havia tomado uma xícara no dia, decidiu ir à cafeteria para solucionar o problema rapidamente. Ela tinha um livro para terminar de ler, mas também pretendia ir à floresta para mais uma caça aos veados.

      A cafeteria era um local popular na localidade, e quatro pessoas estavam trabalhando em seus MacBooks por lá. A fila no balcão era grande, mesmo ainda sendo bem cedo. O burburinho das conversas tomava conta do local, misturando-se ao barulho da máquina de café e ao volume baixo da TV, nos fundos do estabelecimento.

      Avery foi até o caixa, pediu seu café expresso e escolheu um lugar na área de espera. Passou o tempo olhando para o pequeno quadro de cortiça, repleto de fliers de eventos locais: shows, corridas, eventos beneficentes, etc.

      Então, percebeu uma conversa a seu lado. Fez o possível para não parecer óbvio que ela estava prestando atenção, mantendo seu olhos focados no quadro de eventos.

      Havia duas mulheres a seu lado. Uma tinha vinte e poucos anos e tinha um sling no peito. O bebê descansava tranquilamente no aconchego da mãe. A outra mulher era um pouco mais velha e tinha um café em mãos, mas não parecia estar prestes a sair da cafeteria.

      As duas estavam prestando atenção à TV. Elas conversavam em voz baixa, mas Avery pode entender com facilidade.

      - Meu Deus... você soube dessa história? – a mãe da criança dizia.

      - Sim – a outra mulher respondeu. – Parece que as pessoas estão encontrando novas maneiras de machucar umas às outras. Que tipo de mente doente você precisa ter para simplesmente pensar em algo assim?

      - Parece que ainda não encontraram o maluco – a mãe disse.

      - Provavelmente nem vão encontrar – a outra respondeu. Se fossem pegar esse cara, eles já teriam pelo menos pistas. Senhor... imagine a família desse pobre cara, tendo que ver todas essas notícias.

      A atenção de Avery voltou-se então para a barista, que chamou seu nome e a entregou o café no balcão. Avery o pegou e, agora olhando para a TV, permitiu-se assistir ao noticiário pela primeira vez em quase três meses.

      Uma morte havia acontecido nos arredores da cidade uma semana antes, em um complexo de apartamentos simples. Não fora uma morte qualquer, e sim um assassinato bizarro. A vítima fora encontrada em seu closet, coberta de aranhas de várias espécies. A polícia estava trabalhando com a hipótese de que o ato fora intencional, já que metade das aranhas eram de espécies que não eram nativas da região. Mesmo com muitas aranhas na cena do crime, apenas duas picadas haviam

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